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Joana Rita Pinho Resende, diretora de pesquisa do Centro de Economia e Finanças da Universidade do Porto, em Portugal, concedeu entrevista ao GESEL para falar sobre o a experiência europeia com geração distribuída. Segundo ela, “a existência de uma maior coordenação institucional (…) afigura-se como muito importante para que a Europa possa evitar problemas decorrentes de uma ineficiente alocação dos recursos”. Joana Rita Pinho Resende esteve no Brasil no último mês de outubro, a convite do GESEL. Como parte das comemorações dos 20 anos do grupo, pesquisadores de diversos países foram chamados para o Workshop Internacional “Geração Distribuída: Experiências Internacionais e Análises Comparativas”, realizado em parceria com o EKLA-KAS (Programa Regional Segurança Energética e Mudança Climática na América Latina da Fundação Konrad Adenauer). Aproveitando o ensejo, o GESEL também organizou com os visitantes uma série de eventos (palestras, workshops, aulas, reuniões), em diferentes instituições do Setor Elétrico Brasileiro. Leia abaixo a entrevista:
GESEL: É correto afirmar que os incentivos à microgeração solar são fundamentais para a Geração Distribuída?
JOANA RITA PINHO RESENDE: Na minha perspectiva, o desenho apropriado de incentivos à microgeração solar é fundamental para promover a geração distribuída. Essa importância é evidenciada pelo fato dos países com maior preponderância da GD serem também os países que introduziram incentivos mais relevantes (como é por exemplo o caso da Alemanha na Europa, em que o sistema vantajoso de FIT alavancou os investimentos nas tecnologias de GD, que têm uma participação interessante na matriz energética alemã). Noutros países, em que os mecanismos de remuneração são menos favoráveis, a GD não registrou uma evolução tão favorável (a reste respeito, interessa referir o atual regime em Portugal, que é essencialmente baseado num sistema de autoconsumo em que a energia proveniente da GD que é injetada na rede tem uma remuneração em linha com o mercado (grossista).
P: A respeito dos atuais planos nacionais para renováveis na Europa, podemos afirmar que estes tem gerado uma distribuição ineficiente, especialmente em energia solar?
R: No caso Europeu, há ainda uma grande diversidade de realidades em matéria de desenho e implementação de política energética. A relativamente limitada coordenação entre os diversos planos nacionais para renováveis na Europa, tem efetivamente resultado em algumas situações de ineficiência econômica. Para ilustrar este ponto, podemos analisar o que se passa atualmente em matéria de capacidade acumulada de solar PV na Europa, em que a Alemanha acaba por ser um dos países a liderar este setor na UE (em resultado de uma ativa política de promoção deste tipo de fontes energéticas), não obstante existirem outros países (como por exemplo Portugal) onde as condições naturais para a produção de energia solar são bastante mais favoráveis. A existência de uma maior coordenação institucional (em matéria de incentivos à GD mas também outros temas como por exemplo regulação tarifária, definição de targets para as RES-E, plano de investimentos para a construção de uma rede inteligente, mecanismos de sustentabilidade econômico-financeira das utilities tradicionais, enquadramento institucional de novos modelos de negócio a emergir no setor elétrico,…) afigura-se como muito importante para que a Europa possa evitar problemas decorrentes de uma ineficiente alocação dos recursos e tirar o máximo partido da mudança para o novo paradigma do setor elétrico.
P: Como foi a recepção à sua apresentação sobre Microgeração Fotovoltaica e Políticas de Incentivo no Brasil?
R: A recepção à minha apresentação foi muito positiva e considero que a participação neste evento foi uma experiência pessoal e profissional muito enriquecedora. Os eventos organizados pelo GESEL foram uma excelente oportunidade para apresentar a experiência portuguesa (e a diversidade europeia) em matéria de Microgeração Fotovoltaica. Saliento ainda a discussão muito ativa (quer com os palestrantes, quer com os demais participantes) no que respeita à comparação de diferentes experiências internacionais, identificando semelhanças e divergências. As questões levantadas foram muito pertinentes e serão certamente um bom ponto de partida para aprofundar a reflexão crítica sobre o atual processo de transição para um novo paradigma elétrico e sobre os grandes desafios regulatórios que estão a surgir no contexto desse processo.
P: Quais são as expectativas para os próximos passos na cooperação entre sua instituição e o GESEL?
R: A cooperação entre a Universidade do Porto e o GESEL tem vindo a tornar-se cada vez mais estreita ao longo dos anos. Este tipo de iniciativas é certamente muito relevante para aprofundar ainda mais essa cooperação institucional, esperando-se que venham a surgir oportunidades (quer em Portugal, quer no Brasil) para o desenvolvimento de novos projetos conjuntos, no âmbito dos quais seja possível mobilizar os conhecimentos sobre a realidade do modelo elétrico português e do modelo brasileiro tendo em vista a análise dos grandes desafios que se colocam atualmente no setor elétrico e a identificação de estratégias apropriadas para ultrapassar os referidos desafios.